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03/04/18

Novos livros na Biblioteca do CLP/C: "A Inaudita Guerra da Avenida Gago Coutinho"

A Biblioteca do CLP/C apresenta A Inaudita Guerra da Avenida Gago Coutinho do escritor Mário de Carvalho. 

- Sobre o livro:

Uma horda de cavaleiros berberes do Século XII vê-se subitamente em plena Avenida Gago Coutinho por incúria da deusa Clio, que se deixa adormecer, enredando na sua tapeçaria milenar os acontecimentos de 4 de junho de 1148 e 29 de setembro de 1984.

Um elevador não pára de subir. Um frade no seu convento resiste ao Dia do Juízo Final. Um homem simples vive um quotidiano dantesco.

Um chimpanzé é capaz de reescrever a obra Menina e Moça. Um navio negro, desarvorado, muito maltratado pelo mar, dá à costa, trazendo consigo a pestilência. Um padre exorcista tem uma estranha particularidade anatómica.

Integrada no Plano Nacional de Leitura, A Inaudita Guerra da Avenida Gago Coutinho é uma das obras mais emblemáticas de Mário de Carvalho. 


- Sobre o autor:

Mário de Carvalho nasceu em Lisboa em 1944. Licenciou-se em Direito e viu o serviço militar interrompido pela prisão. Desde muito cedo ligado aos meios da resistência contra o salazarismo, foi condenado a dois anos de cadeia, tendo de se exilar após cumprir a maior parte da pena. Depois da Revolução dos Cravos, em que se envolveu intensamente, exerceu advocacia em Lisboa. O seu primeiro livro, Contos da Sétima Esfera, causou surpresa pelo inesperado da abordagem ficcional e pela peculiar atmosfera, entre o maravilhoso e o fantástico.

Desde então, tem praticado diversos géneros literários – romance, novela, conto, ensaio e teatro –, percorrendo várias épocas e ambientes, sempre em edições sucessivas. Utiliza uma multiforme mudança de registos, que tanto pode moldar uma narrativa histórica como um romance de actualidade; um tema dolente e sombrio como uma sátira viva e certeira; uma escrita cadenciada e medida como a pulsão duma prosa endiabrada e surpreendente.

Nas diversas modalidades de Romance, Conto e Teatro, foram atribuídos a Mário de Carvalho os prémios literários portugueses mais prestigiados (designadamente os Grandes Prémios de Romance, Conto e Teatro da APE, o prémio do Pen Clube e o prémio internacional Pégaso). Os seus livros encontram-se traduzidos em várias línguas.


Na biblioteca do CLP/C existem outros livros deste autor:


Água em Pena de Pato

Na sua primeira colectânea de teatro, Mário de Carvalho quis escrever peças que fossem o «reflexo» do Portugal pós-revolucionário. Nelas traça as desventuras de uma geração que, passado o entusiasmo da Revolução, constata com amargura a distância que separa as esperanças por ela suscitadas da realidade. Para dizer esse desencanto português, que ecoa o declínio dos ideais no mundo, o autor adoptou uma dramaturgia próxima do «Teatro do Quotidiano». Recusando a idealização (tanto formal como ideológica), oferece assim uma representação voluntariamente prosaica — talvez até paródica — da sociedade portuguesa, enredada nas suas contradições, e denuncia a imutabilidade dos seres e dos tempos, imediatamente sugerida pelo título.


 Casos do Beco das Sardinheiras


O Beco das Sardinheiras é um beco como outro qualquer, encafuado na parte velha de Lisboa. Uns dizem que é de Alfama, outros que é já da Mouraria e sustentam as suas opiniões com sólidos argumentos topográficos, abonados pela doutrina de olisiponenses egrégios. Eu, por mim, não me pronuncio. Tenho ideia de que ali é mais Alfama, mas não ficaria muito escarmentado se me provassem que afinal é Mouraria. Creio que o nome lhe vem das sardinheiras que exibem um carmesim vistoso durante todo o ano, plantadas num canteiro que rompe logo à esquina, não longe da drogaria que já fica na Rua dos Eléctricos. A gente que habita o Beco é como as demais, nem boa nem má. Tem sobre os outros lisboetas um apego ainda maior ao seu sítio e às suas coisas. Desde há muito tempo que não há memória de que algum dos do
Beco tenha emigrado de livre vontade.


Contos da Sétima Esfera 

No final do Batuque, o jovem cuanhama, muito bebido de cerveja de palma, vergou o arco e disparou uma flecha para as alturas. Era o comportamneto reprovável, pois os anciãos sempre desaconselharam agredir os céus, desculpável, no entanto, pela alacridade ambiente e eflúvios do licor fermentado. Então foi pela primeira vez perfurado o ponto, até aí intocado de voo de pássaro ou mão de homem, em que nascem as transmutações.
E, de súbito, todos os homens, de todas as partidas do mundo, ficaram sem as suas sombras. Não que as sombras desaparecessem, mas tomaram posse de si, movendo-se em liberdade, como se cada sombra fosse a sombra de um outro ausente. Vencido o pânico inicial, os homens acostumaram-se, embora com um toque de estranheza, aos caprichos e autonomia das sombras.



Fantasia para Dois Coronéis e uma Piscina

Dois coronéis discutem Portugal à beira duma piscina, num monte alentejano. Nada lhes escapa. Duas mulheres mostram-se, em tudo, contrárias entre si. Um jovem vedor de água e jogador de xadrez, de muito bom feitio, arroja-se por essas carreteiras no seu estafado Renault 4. Um tio misógino aconselha sabiamente o sobrinho. Soraia Marina, capitosa cantora pimba, embala as almas simples. Gil Vicente e o pote de Mofina Mendes também marcam presença. E um narrador curioso intervém com as suas perspicazes considerações, sob o olhar sempre atento de um mocho e de um melro, que assistem e, às vezes, comentam.



 Se Perguntarem por Mim, Não Estou Seguido de Haja Harmonia


"Os morcegos têm má visão e andam sempre a entrar onde não devem! Uma noite, um morcego entrou na cova duma doninha que era uma grande comedora de ratos. E vai a doninha e diz-lhe: «Que bom, olha um rato, vou comê-lo.» E o morcego respondeu: «Não vês que tenho asas? Onde é que tu viste um rato com asas? Eu não sou um rato, sou um pássaro!» E a doninha, que não gostava de pássaros, deixou-o ir embora. Mas o morcego, atarantado, foi ter a um buraco de árvore em que havia um gavião. O gavião adorava pássaros, e diz: «Olha que boa coisa, um passarinho que vem mesmo a calhar!» Mas o morcego respondeu: «Essa é boa! Passarinho, eu? Olha para este pêlo, tão liso e tão macio! Onde é que tu vês as penas?» O gavião disse: «É verdade, não tem penas... não é um pássaro.» «É evidente que não», respondeu o morcego, «eu sou um rato.» «Bah, detesto ratos», respondeu o gavião. E deixou o morcego ir-se embora... Eu sou assim... Numas circunstâncias... sou uma coisa; noutras, sou outra... Assim tenho evitado as chatices. Enfim... algumas..."










Fonte: www.wook.pt